>>> Para o crítico literário Rainer Just, a estrutura administrativa necessária para a publicação de um livro dificilmente poderia ser assumida pelo autor. Ah, e ele também tem algo a dizer sobre pirataria
A onda do selfpublishing entrou com tudo no mercado editorial. Qualquer um pode ter uma conta no KDP ou na Kobo Writing Life, publicar por conta própria e obter um percentual dos ganhos que nenhuma editora jamais ofereceu. Parece muito promissor, mas a verdade é que esse novo universo literário está ficando povoado por obras, digamos, sem noção: erros gramaticais são os mais suaves.
Para o crítico literário alemão Rainer Just, existem outras dimensões que o autor dificilmente seria capaz — ou paciente o suficiente — de acumular com o ofício de escrever. “Marketing, precificação, vendas, transportes, gestão financeira, etc. Os autores precisam de alguém para fazer esse trabalho”, explica, em entrevista exclusiva que você pode conferir na íntegra logo abaixo.
Um artigo da Forbes revela que o selfpublishing não é interessante sequer para muitos escritores, como o britânico Joe Abercrombie. “Eu não quero publicar, eu quero escrever”, disse, em conversa com a colunista Suw Charman-Anderson. “Escritores auto-publicados que obtiveram sucesso estão contratando editores, designers, publicitários… em outras palavras, eles estão se tornando pequenas companhias editoriais. Pequenas, muito motivadas, porém muito ineficientes”, explica.
Rainer Just participou de um painel sobre o Direito Autoral na era do livro digital durante o 4º Congresso Internacional do Livro Digital.
Você é a favor ou contra a pirataria de eBooks? Por quê?
Sou definitivamente contra. Você não pode pegar uma propriedade sem pedir permissão antes. A pirataria fere tanto os direitos individuais quanto os direitos de propriedade. O autor sempre deve ter o direito de decidir sobre o que será feito com o seu trabalho.
Por que as pessoas compartilham as coisas ilegalmente? É um desvio de comportamento, ou um comportamento comum?
Eu diria que os dois. Ou uma mistura dos dois. E acrescentando a isso uma combinação de falta de conhecimento e conforto egoísta.
A Alemanha tem um Partido Pirata ativo, que pretende mudar as leis de copyright. Como você, como um crítico literário, enxerga a questão da pirataria no mundo digital? Ela realmente atinge os autores e as vendas de eBooks?
A pirataria definitivamente fere e previne as pessoas não apenas de comprar eBooks, mas também de comprar livros físicos. A pirataria faz com que as pessoas pensem, em geral, que tudo é grátis. O Partido Pirata na Alemanha já foi votado pelas pessoas por protestar contra os partidos políticos clássicos, mas não pelo seu programa. Atualmente, os “Piratas” são menos de 5% de todos os eleitores – se continuar assim, os Piratas não serão mais uma parte do Parlamento, depois das próximas eleições neste outono.
O Creative Commons vem ganhando mais poder nos últimos anos. Várias imagens, ilustrações e até músicas estão sendo licenciadas sob CC. Mas não vemos muitos livros utilizando esta licença. É um bom caminho para os autores?
Nada a dizer contra o Creative Commons. O importante é que o autor decida sobre o uso que vai ser feito com o seu trabalho. Se ele quiser licenciar sob CC, todos nós temos que respeitar isso.
Atualmente os autores não dependem tanto dos editores ou agentes literários. Se ele quiser, pode escrever e vender diretamente para o leitor. Você enxerga isso como um empoderamento? Ou os autores ainda precisam tranferir seus direitos para as editoras?
Têm havido muitas tentativas de se vender diretamente ao leitor. Quase todos os autores que fizeram isso falharam. Atrás de um livro, existe todo um mundo de trabalho administrativo para ser feito. Marketing, precificação, vendas, transportes, gestão financeira, etc. Os autores precisam de alguém para fazer esse trabalho. As possibilidades de um autor, sozinho, se tornar um sucesso de vendas no mercado, são bem limitadas.