Citia, o resumo de livro da era dos tablets

06/06/2012
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Se você tem tempo e dinheiro, você é o melhor cliente da indústria editorial. Se você tem tempo, mas não tem dinheiro, você vai à biblioteca. Se você não tem tempo e nem dinheiro, você acessa o YouTube. Mas, se você tem dinheiro e não tem tempo, a indústria do livro não tem nada pra você.

Quem disse isso não fui eu: foi Linda Holliday, que se inspirou neste pensamento para fundar a Semi-Linear, empresa que desenvolveu a plataforma de leitura Citia. A ideia é simples: um livro de não-ficção baseado em conceitos é lido, desconstruído e reorganizado na forma de cartões que abordam pontos particulares do texto. Cada cartão tem entre 100 e 150 palavras e é facilmente compartilhável por e-mail, Facebook e Twitter. Os conjuntos de cartões formam decks que exploram os principais conceitos do livro, sem seguir os capítulos ou mesmo a ordem em que são apresentados no livro. Aliás, nem a prosa do autor é preservada: o texto é quase completamente reescrito, de forma a apresentar os conceitos de forma mais imediata. Segundo a Semi-Linear, este formato de leitura pode reduzir o tempo de apreensão dos pontos principais do livro de 6-10 horas – tempo médio de leitura de um volume – para algo entre 45 minutos e 2 horas. Além disso, a maneira como as ideias estão organizadas faz com que seja mais fácil chegar até um conceito específico, caso o leitor não esteja interessado em tudo o que é abordado no livro.

O primeiro aplicativo da plataforma é baseado no livro “What Technology Wants”, de Kevin Kelly, co-fundador da revista Wired, e está disponível na App Store por US$9.99. Desde que foi ao ar, no último dia 31, vêm pipocando elogios à iniciativa; entre eles, está o texto que Mike Shatzkin publicou em sua coluna discutindo as vantagens do novo formato. Entre as desvantagens que ele apontou, não estava nenhuma característica do próprio app, e sim a demora do mercado editorial em se adaptar a algo que nunca havia sido feito antes:

“As respostas de agentes, editores e responsáveis pelos direitos autorais foram extremamente positivas, mas a requisição de direitos foi muito complicada. Alguns players estavam com medo de que os apps da Citia pudessem canibalizar mais vendas do livro do que poderiam gerar. Outros tinham a preocupação de que os autores não gostariam de ver seu trabalho modificado deste modo e, de fato, a aceitação – se não o entusiasmo – do autor foi rapidamente vista como importante pela Semi-Linear, ainda que a equipe do Citia realmente faça todo o trabalho considerável necessário para criar a sua versão. (O autor do primeiro título, o co-fundador da Wired Kevin Kelly, se disse ‘estupefato’ e ‘orgulhoso’ do trabalho que eles haviam feito).

E ainda há a complicação de fazer uma licença para um acordo de um tipo que nunca foi feito antes. Editoras gostam de modelar novos contratos a partir de velhos contratos. Leva um tempo para que elas fiquem confortáveis com um formato de produto completamente diferente e um modelo de negócios totalmente novo. Isso simplesmente não acontece com muita frequência. Quando foi a última vez que alguém gastou dezenas de milhares de dólares para desenvolver, desconstruir e entregar uma nova apresentação de um livro de catálogo? Como funcionaria a aprovação do autor? Qual é de fato o royalty justo? E qual é a compensação justa à Semi-Linear para as vendas adicionais que o seu marketing do título criaria?”

Sem dúvida, a aceitação de autores e editores é um passo importantíssimo para o projeto – neste sentido, a escolha de um autor extremamente familiarizado com a tecnologia (e entusiasmado em relação a ela) foi sábia. Confesso que, ainda que em livros conceituais o estilo de quem escreve não costume ser tão marcante quanto em obras de ficção, acho um pouco difícil superar o respeito pelo livro da forma como foi narrado e organizado pelo autor. Ainda assim, o Citia não deixa de ser um jeito interessante (e bonito) de apresentar materiais complexos. Que há mercado para livros “resumidos”, é razoavelmente seguro supor: aí está o Cliffs Notes desde 1958 para provar. Posso estar sendo conservadora e apegada ao “velho” formato ao dizer isso, mas espero que o modelo seja bem-sucedido como forma de introduzir o leitor a conceitos e autores, e não como substituto para eles.

Quem quiser tirar suas próprias conclusões pode ver a amostra de um deck disponível no site do Citia, ou assistir a este vídeo da própria Linda demonstrando o app na conferência All Things Digital.

 

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