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Edital para Bibliotecas Digitais 2018, do MinC, ignora a realidade


Recebi semana passada, uma dúvida de um gestor de biblioteca pública, a respeito do Edital para Bibliotecas Digitais 2018, do Ministério da Cultura. A dúvida foi bem simples: “O edital diz para comprar somente e-readers?”. Li com bastante atenção antes de responder. Realmente, está lá, item 1.2.1:
1.2 Os projetos apresentados deverão destinar recursos, exclusivamente, para o cumprimento dos seguintes objetivos:
1.2.1 Ambiente digital: aquisição de equipamentos: e‐readers (leitores de livros digitais), de modo a permitir que os usuários da biblioteca tenham condições de ter acesso ao acervo digital a ser disponibilizado.
1.2.2 Ambiente visual: aquisição de móveis para compor os espaços em que serão realizadas ações futuras com o tema de bibliotecas digitais, como puffs, quadros, mesas, etc.
1.2.3 Acervo digital: aquisição de licença para acesso a livros em formato digital para leitura em tela de aparelhos como e‐readers e computadores, de modo a permitir que o usuário também tenha acesso a esse tipo de acervo, além do acervo físico que já á disponibilizado.
Embora o item 3 mencione computadores, o edital trata ali da aquisição de licença de acesso a livros que permita também a leitura em computadores. No quesito “aquisição de equipamentos” para o “ambiente digital” da biblioteca, o edital é taxativo: somente “e-readers (leitores de livros digitais)”. Um pouco depois, o edital ainda acrescenta:
1.4. Para fins deste Edital, considera‐se biblioteca pública aqueles equipamentos culturais que atendem (…) todos os públicos, bebês, crianças, jovens, adultos, pessoas da melhor idade e pessoas portadoras de deficiências ou com mobilidade reduzida (…)
Aí está o grande problema/contradição do edital. Os e-readers, como Kindle, Kobo e outros, são muito limitados. Suas telas pequenas e em preto-e-branco são ótimas para a leitura confortável de textos simples e imagens sem muitos detalhes. Porém, qualquer livro que vá além disso, será difícil, ruim ou até impossível de ler nestes aparelhos — sendo sucinto, livros infantis, livros técnicos, gráficos, tabelas com mais de 3 ou 4 colunas, diagramas, mapas, livros didáticos… a lista completa seria bem maior.
O e-reader é uma tecnologia que caiu em desuso, desde 2012/2013, porque smartphones e tablets estão disseminados e também permitem a leitura de livros digitais (e obviamente todo o universo de outras coisas que sabemos). Infelizmente o edital parece ter “esquecido” que tablets existem, pois não faz qualquer menção a eles, engessando as Bibliotecas Digitais a um formato muito limitado de leitura digital.
Estamos em 2018, como pode um edital para uma biblioteca digital desconsiderar tablets para a leitura digital? É, no mínimo, muito discutível a utilidade de um e-reader para um amplo público das bibliotecas. Alguns exemplos: crianças não-alfabetizadas, estudantes, portadores de deficiência visual (a grande maioria dos modelos de e-readers não comporta a narração do texto escrito). Que conteúdo poderão usufruir em um e-reader? Quase nenhum. Em um tablet, isso seria possível, mas não em um e-reader. A principal diferença de um tablet, comparado a um e-reader, é justamente a capacidade de acessar/ler todo tipo de conteúdo, em todo tipo de formato, com mais qualidade e variedade. No tablet, você pode ver as cores de uma ilustração (o mínimo que uma criança merece), pode ouvir o texto ser narrado pelo aparelho, conferir os detalhes de um mapa ou desenho técnico. E não interessa o formato (PDF, ePub, etc etc…), pois o tablet dá conta de virtualmente todos, graças ao sem-número de aplicativos disponíveis. Tantos outros recursos e possibilidades, que permitem enriquecer a leitura e a utilidade do livro digital, não disponíveis em e-readers.
Financiar bibliotecas digitais que ignoram a realidade, a situação atual da tecnologia, limitando a utilidade aos usuários, está destinada a ser ainda mais um recurso público sub-aproveitado — no caso, R$ 2 milhões. Os gestores das 20 bibliotecas digitais que forem montadas, a partir deste edital, terão uma biblioteca digital “meia-sola”, que não irá atender todo o público. Uma pena.

 

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