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A experiência da auto publicação vista de dentro

19/12/2012
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Colaboração de Maurem Kayna

Muito tem sido dito sobre auto publicação, mas a maioria dos artigos não vem dos protagonistas desse recurso – os próprios autores – são análises de mercado, comparações com os modelos ‘tradicionais’ de publicação e projeções alvissareiras de um lado contra fatalismos saudosistas de outro.

A primeira questão a discutir em termos de publicação independente, quando pensamos no ponto de vista do autor, é justamente a decisão de se lançar à empreitada. A maioria dos candidatos a escritor e também dos escritores não reconhecidos pelo mercado editorial queixa-se das dificuldades para ser publicado. Em geral a lamúria tem em mente a publicação no meio impresso. O advento dos e-books surgiu como uma promessa de combate a esse obstáculo e muito tem sido alardeado sobre as possibilidades desse canal – exemplos de fenômenos como Amanda Hoking e E. L. James sempre são lembrados. Mas convém, como em tudo na vida, moderar na expectativa. Seja em papel ou em formato digital estar publicado não significa que o autor será lido, menos ainda que terá expressivos volumes de venda ou que cairá nas graças da crítica (isso vale inclusive para autores lançados por editoras conhecidas).

Dito isso, vamos ao que posso partilhar de minha própria experiência. Tenho, a rigor, quatro e-books publicados de modo independente, cada um utilizando um modelo / plataforma diferente. A partir desses ensaios, destaco, a seguir, as principais características de cada modelo de publicação, analisando aspectos técnicos e a demanda de energia e conhecimentos específicos do autor. Incluo, ao final de cada análise, uma avaliação da experiência do usuário (completamente subjetiva, claro).

Pedaços de Possibilidade, 2010. ISBN 9788563654205

Plataforma: Simplíssimo (Autores Livres)
Envio dos originais: arquivo em formato word
Revisão / Copidesk: responsabilidade do autor
Definição do preço de capa: responsabilidade do autor
DRM: conforme a livraria onde será distribuído (a maioria aplica DRM)
ISBN: obtido pela Simplíssimo
Locais de venda: Cultura, Saraiva, Amazon, Apple ( iBookstore / iTunes), Kobo,
Formato de arquivo: ePub, mobi
% preço de capa que fica com o autor: 90%
Divulgação: responsabilidade do autor
Experiência do usuário: é ótimo não precisar se preocupar com a edição e a burocracia de obtenção de ISBN; o resultado visual é muito bacana e a abrangência em termos de lojas online onde o livro é distribuído é ótima (isso conta muito).

De teias e paletas, 2011. ISBN 9781301841615
Plataforma: Smashwords
Envio dos originais: arquivo em formato word
Revisão / Copidesk: responsabilidade do autor
Definição do preço de capa: responsabilidade do autor, exceto quando se escolhe a opção “o cliente decide o preço” (nesse caso o preço para revendedores afiliados ao Smashwords será definido como US$4.95)
DRM: opcional, o autor decide no caso das vendas no site Smashwords, mas para venda em outras livrarias e afiliados, dependenderá da política de cada um deles
ISBN: gerado automaticamente pela plataforma
Locais de venda: Smashwords; se atendidos os requisitos (ISBN e padrão de capa + resultado da conversão): Apple, Kobo, Barnes & Noble, e diversos outros afiliados
Formato de arquivo: 10 diferentes formatos, incluindo ePub, Mobi, PDF e HTML para leitura online
% preço de capa que fica com o autor: 60 a 85 (dependendo de onde a venda foi efetuada – no próprio SW ou em sites afiliados)
Divulgação: responsabilidade do autor
Experiência do usuário: a relação é distante para nós brasileiros, mas trata-se de um empreendimento muito bem intencionado que dá liberdade e abrangência aos autores, porém, peca quanto à qualidade visual dos e-books por estar baseado em conversão automática. A alternativa de poder colocar o seu e-book no modelo “pague quanto quiser” me parece boa política.

Contos.com, 2012
Plataforma: iTunes Producer
Envio dos originais: arquivo em formato iBooks (editado via iBooks Author – software gratuito para IOS)
Revisão / Copidesk: responsabilidade do autor
Definição do preço de capa: só tive a experiência da distribuição gratuita, para a qual basta ter uma inscrição “Free Books Account”; quando se deseja vender no iTunes ou iBookstore é preciso uma “Paid Books Account”, o que requer outro cadastro e um TAX ID Number (não é impossível obter, mas é trabalhoso, especialmente para quem odeia burocracia e/ou não é fluente no inglês)
DRM: sim
ISBN: Não é obrigatório para distribuição gratuita, para venda o próprio autor deve fornecer.
Locais de venda / distribuição: iTunes / iBookstore (de 50 países)
Formato de arquivo: iBooks
% preço de capa que fica com o autor: desconheço a política no caso das contas “Paid Books Account”
Divulgação: responsabilidade do autor
Experiência do usuário: Apple – é o sistema menos amistoso para se lidar, apesar do belo resultado visual e da incrível penetração junto aos consumidores (o e-book distribuído lá tem um histórico de mais de 200 downloads em 3 semanas), os julgamentos de “qualidade” da equipe da iTunes Conect podem gerar muito desgaste (ódio, até… em alguns momentos). Mas é importante estar lá… muito, então, um intermediário que se ocupe disso é mais que bem vindo.

Contos.com.MK, 2012. ISBN 1230000036469
Plataforma: Kobo Writing Life
Envio dos originais: arquivo em formato ePub (editado com Sigil – software gratuito para IOS, Windows e Linux), mas também pode ser word.
Revisão / Copidesk: responsabilidade do autor
Definição do preço de capa: definido pelo autor (em dólar, automaticamente convertido para reais na loja brasileira)
DRM: o autor decide
ISBN: gerado automaticamente pela plataforma
Locais de venda / distribuição: Kobo Books (possivelmente logo será possível definir outros parceiros da Kobo)
Formato de arquivo: ePub
% preço de capa que fica com o autor: 70% (os primeiros a se inscrever na plataforma tinham um bônus: 80% do preço de capa).
Divulgação: responsabilidade do autor
Experiência do usuário: para a publicação independente sem suporte de edição, esta me pareceu a melhor, pelo fato de permitir o upload já em ePub (livrando-nos da conversão automática), não há censura como na Apple, e a disponibilização do e-book na loja é rápido e o gerenciamento de vendas é muito simples de se acompanhar. Para quem não domina a edição, pode contratar o serviço ou enviar um arquivo word, pois a plataforma também trabalha com conversão.

Diante dessas alternativas de distribuição cabe considerar, em primeiro lugar, quanto tempo o autor está disposto a investir (do tanto que ele tem disponível) em aspectos diversos da produção textual em si. Especialmente pelo fato de que nenhuma das plataformas de publicação mencionadas acima tem compromisso com a divulgação da obra – e este é um ponto crucial para que seu e-book venha a ser lido, eventualmente recomendando por alguém cuja opinião faça a diferença e, se tudo correr bem, vender o suficiente para ao menos recuperar o investimento (caso a publicação tenha envolvido custos com diagramação, revisão, capa e etc).

Além da divulgação, tenha em mente que editar um e-book, embora não seja particularmente complexo, é trabalhoso, requer um mínimo de conhecimento para evitar problemas grosseiros que interfiram na experiência do leitor. A título de exemplo, nos dois casos em que me ocupei com a edição, devo ter consumido entre 8 e 12 horas de trabalho para a diagramação, confecção de capa e alguma revisão e teste do resultado em diferentes aparelhos (tablets e e-readers). Considere-se que tenho a sorte de ter acesso a diferentes aparelhos (um iPad, um Positivo Alfa, um Kindle e, mais recentemente, um Kobo), então posso verificar, antes de colocar no ar (ou mesmo depois, pois todas as plataformas permitem updates) e corrigir os problemas mais gritantes (nem todos eu consegui corrigir, aliás… um pouco por preguiça outro tanto por falta de habilidade).

Não é adequado subestimar a importância de uma boa revisão. Não me refiro apenas à correção gramatical, mas a uma leitura crítica que possa identificar lacunas ou inconsistências relevantes no seu livro. Custa dinheiro? Sim. A menos que você conte com amigos sinceros o suficiente e com uma bagagem de leitura que permita lhe ajudar com esse ponto. O olhar externo faz toda a diferença, por mais hábil que o escritor seja com a língua portuguesa.

Sei que não estou mencionando nada muito original nesse apanhado, mas é preciso um forte senso de realidade. Quantos e-books independentes estão disponíveis no mercado (incluindo como mercado a distribuição gratuita só a título de divulgação)? Eu também não tenho esse número, mas, com base nas minhas navegações diárias, ele é elevado e só crescerá. Num cenário assim, simplesmente jogar um material “dentro da média” no circuito trará um resultado igualmente mediano, ou seja, sem nenhum efeito prático na formação de um público leitor.

Por fim, quanto à plataforma da Amazon Kindle Direct Publishing – KDP – não tive vontade de testar antes da abertura da Amazon.com.br, e mesmo agora não me sinto muito motivada. Como o e-reader da Kobo chegou antes, prefiro canalizar esforços para o e-book disponibilizado na Kobo Books.

 

  1. Muito bom! Obrigado por compartilhar. Visitei a Kobo Writing Life, mas parece que pelo Brasil não está pronta. Você publicou em inglês?

    1. Dr beco, o site está em inglês, mas você pode selecionar o idioma da obra em que publicará. Como mencionei, o preço é definido em dólar, mas na loja brasileira ele aparecerá em reais.

  2. Útil e interessante. Vou partilhar com pessoas que escrevem e já tem livros lançados. Com certeza gostarão muito.
    (Que pena não ter “ainda” experimentando/utilizado o KDP. “Tava” na expectativa de ler algo a respeito).

    O “Know-How” só vai aumentando!!!

    1. Pois é Gilmar, ainda devo testar essa plataforma, mas por enquanto não pintou. Há que pensar num tempo para ler, pois sem isso não há como escrever e essas funções todas com plataformas e softwares consomem tempo. ;o)
      Abraço!

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