Livros São Isentos de Impostos. E-books Pagam. Logo, E-books Não São Livros?

11/05/2010
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Atualização em 22/03/2018 – o STF decidiu pela imunidade de ebooks e ereaders e a decisão transitou em julgado em março de 2018, garantindo a esses novos suportes a imunidade fiscal garantida ao livro físico pela Constituição Federal. O que poucos souberam, no entanto, é que a União, uma das partes envolvidas no processo, entrou com um recurso de embargo de declaração, alegando que a sentença incidiu em erro e omissão. No início de fevereiro, o Tribunal rejeitou o recurso e, finalmente, na última segunda-feira (19/03/2018), o processo finalmente transitou em julgado, ou seja, nenhuma das partes poderá mais recorrer da sentença. Ebooks definitivamente livres de impostos, portanto!

As leis no Brasil oscilam entre o satírico e o sobrenatural. A interpretação delas então…

anos circulam nos tribunais brasileiros ações questionando a cobrança de impostos sobre livros vendidos em formato eletrônico. Mais especificamente, enciclopédias e livros vendidos em CD’s. Enquanto as cortes de primeira e segunda instância dão ganho de causa aos editores, o STF derruba essas decisões, reafirmando: se não for em papel, tem que pagar imposto.

Toda a discussão gira em torno de um trecho pontual da Constituição do Brasil. Mais precisamente, o Título VI, “Da Tributação e do Orçamento”, seção II, “DAS LIMITAÇÕES DO PODER DE TRIBUTAR” (a caixa alta é da Constituição), Art. 150, inciso VI, alínea “d”:

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(…)
VI – instituir impostos sobre:
(…)
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.

O argumento dos ministros do Supremo Tribunal Federal, para negar a isenção de impostos a CD’s que contêm livros, tem sido o seguinte: a imunidade concedida na Constituição Federal só fala do papel. A decisão superior mais recente, do ministro Dias Toffoli, cita a jurisprudência do STF sobre o assunto para novamente negar a isenção de impostos a livros em outros formatos que não o impresso.

O português da língua dos tribunais deve ser diferente do português que empregamos nos livros. Não é preciso ser um gênio da língua portuguesa, para verificar que o texto da Constituição não está vinculando o papel aos livros, apenas relacionando os itens imunes à tributação. Como este advogado explica,

Na Constituição lê-se que é vedada instituição de impostos sobre “livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão”. “E” é uma conjunção aditiva. É, pois, como a gramática ensina, uma adição e não uma subordinação. Não há, portanto, pela dicção legal, uma limitação do termo livro ao papel, senão que simplesmente a lei estende a esse específico insumo a imunidade.

Pena que nem todos os juristas possuem esse grau de conhecimento da língua! E que decisões não possam ser tomadas, apenas a partir das regras gramáticais da língua portuguesa. É sempre preciso ir além,  convencer os juízes da utilidade da Constituição e do espírito que existe dentro dela.

Os magistrados de primeira e segunda instâncias já dão sinais de convencimento. Mas os ministros do Supremo, quando vão às livrarias, devem sair delas carregando chumaços de papel com letras escritas, ao invés de livros… em Brasília, as livrarias devem ser muito diferentes do resto do país. Essa semana vou estar lá e poderei conferir isso pessoalmente. Me comprometo a trazer uma resposta para os nossos leitores e esclarecer, afinal, se o que se compra nas livrarias de Brasília são livros, ou chumaços de papel.

O que conceitua um livro? Livro é o conteúdo, ou o suporte? Essa discussão é mais velha que o chão que nós pisamos. Alguns magistrados insistem em passar ao largo desse debate.

Se o espírito da Constituição é livrar os livros, jornais e periódicos de impostos, porque os magistrados insistem em adotar decisões que vão contra esse propósito? O legislador de 1988 não poderia sonhar que, um dia, livros poderiam ser feitos sem papel. Apesar disso, sua intenção foi bastante clara: isentar os livros, jornais e periódicos de impostos, desonerar as ferramentas elementares de difusão do conhecimento e da cultura.

Quando o legislador incluiu a expressão “e o papel destinado a sua impressão”, foi para assegurar que o Estado não caísse na tentação fácil (e arbitrária) de taxar o papel para, mesmo indiretamente, burlar a norma constitucional. O legislador redigiu para proteger o livro, não somente o papel em que seria impresso.

O artigo da Constituição não precisa ser reescrito, só precisa ser lido. Eu não sou advogado. Mas me espanta ver o quanto os magistrados se afastam do espírito da nossa Constituição. E do texto dela.

Se ninguém se mexer, teremos consolidada uma situação sui generis no Brasil: você comprará um livro impresso, sem impostos. Ao comprar o mesmo livro, em versão e-book e sem papel, incidirão todas as taxas possíveis e imagináveis. O conteúdo será o mesmo, o e-book vai ter um ISBN como um livro impresso, seguirá as normas técnicas do mesmo jeito… e mesmo com o texto da Constituição afirmando que livros devem ser isentos de impostos, e-books não serão considerados “livros”.

É surrealismo demais para 2010.

 

  1. Reforma tributária já!
    Sabemos que a questão tributária no Brasil é um baita formigueiro. Porém, se não arranjarmos um tamanduatá patriota, com urgência, o problema continuará se arrastando por décadas.
    A nota fiscal eletrônica está aí. Apesar de alguns deslizes, aqui e ali, ela tem funcionado bem. Pode ser o começo da virada.
    Creiamos e pressionemos os deputados e senadores, a fim de se discutir este assunto seriamente.
    Pré-Sal na educação e reforma tributária já!

  2. Pingback: Os chatos web apocalipticos | RafaelMoreira.net Blog

  3. Pois é eduardo melo isso so ajuda a ilustrar o nível de atrasdo do nosso querido e amado país….

  4. “Não leio muito porque dá sono”(Luiz Inacio Lula da Silva)
    Um presidente que fala isso,não pode falar em fomentar a leitura.
    Aqui, no Brasil o que se fomenta realmente é a corrupcção!!!
    

  5. Chega a ser cômica a interpretação do Supremo, pois o texto da Constituição diz: d) livros, jornais, periódicos E o papel destinado a sua impressão. Quando esta escrito LIVROS JORNAIS E REVISTAS E.. E.. o papel destinado a sua impressão, quer dizer livro jornais e revistas, não interessa sua forma, desde que sejam livro jornais e revistas, são isentos, E TAMBEM, o papel que se destina à impressão quando for o caso.

    Imaginemos as interpretações, revistas pornográficas em papel são isentas, o que acham disso?.

  6. Na Constituição lê-se que é vedada instituição de impostos sobre “livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão”.

    Sugiro propormos uma Emenda costitucional que mude o texto para:
    “é vedada instituição de impostos sobre “livros, jornais, periódicos BEM COMO O MEIO FÍSICO OU VIRTUAL UTILIZADO PARA SUA DISTRIBUIÇÃO”

    Se conseguirmos isto, vamos acabar com a discussão.

    1. Post
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  7. Essas alegações não são totamente verdade. quantos componentes eletrônicos tem um E-Book??
    se começarem a Não tributar tudo que forneça material para leitura, o que irá surgir depois??

    Reformar sim, mas generalizar jamais!

  8. CONTUDO, diz-se: “e o papel destinado a SUA impressão.”
    A tal gramática também diz que ‘sua’ é pronome de posse… Subtende-se que os livros e jornais SÃO FEITOS de papel.

  9. Pingback: Menos leitura, mais comprimidos « #CotidianaMente

  10. Pingback: A gente precisa ler mais « Direito é legal

  11. Enquanto as autoridades judiciárias se colocarem acima da lei quando convém, continuaremos a ver estas arbitrariedades, as injustiças e a violência. O interessante é que quando a justiça deve prevalecer em relação à lei, as autoridades se agarram a lei para garantir a injustiça. E mesmo quando lei garante claramente um direito, as autoridades se agarram a um espaço que se quer existe como é o caso do livro eletrônico, e eles não estão nem ai para a falta de argumentos, e nem para a inversão do direito assegurados por lei. E olhe que a Ministra Eliana Calmon vem criticando com veemência a juizite, no entanto ela está impregnada até na mais alta corte do país. Enquanto os operadores do direito estiverem à margem da lei, enquanto juízes retirarem os filhos dos pais e os entregarem para estranhos sabem-se lá porque motivo, enquanto não houver punição para esse tipo de delituoso, enquanto a punição para esses criminosos for à aposentadoria com os proventos vitalícios, continuaremos a assistir a essa bagunça.

  12. Nas origens da internet, eu era editor executivo do Estadão. Encomendamos ao prestigiado tributarista Ives Gandra Martins um parece sobre essa questão. Sua resposta foi exatamente essa interpretação equivocada do STF. Durante a reunião na qual foi apresentada sua tese, eu perguntei: Tudo bem, enviamos o conteúdo para o assinante, ele recebe o jornal na tela, incluimos o imposto, pagamos regularmente. Mas o indigitado cidadão, em vez de ler na tela, resolve imprimir pra ler o jornal no metrô. Como fica? – O nobre jurista respondeu: nesse caso, vale a isenção. Ou seja, trata-se de uma verdadeira aberração.

    1. Oi Luciano. Este texto que você comentou está no ar há quatro anos… e continua atual. Uma lástima mesmo. Abraço.

  13. Realmente é complexa pois a leitura de livros gerados por mentes iluminadas se tornam eternas fontes que geram a dignidade a saúde familiar e outros valores que se tornam bumerangue contra a imoralidade e a morte da honra.

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