Enquanto montam uma peça de teatro de marionetas, os titereiros Kismet e Oblata discutem sobre o conteúdo do texto e o devir das personagens. Em desacordo muitas vezes, assentam, ambos, em que o texto deverá ser uma reflexão sobre o amor e a diversidade/dificuldade das relações sentimentais. Nesta acalorada discussão, Oblata e Kismet detêm-se na inevitável ambiguidade do discurso amoroso, no facto das palavras cúmplices e doces, trocadas pelos apaixonados, serem exatamente as mesmas e, no entanto, acoitarem, em si, perspetivas distintas as quais, silenciosamente, vão urdindo a distância, a rutura.

Para cumprir o seu desígnio, Oblata e Kismet, demiurgos deste universo, criam o par protagonista, Cursino e Valéria, atribuindo àquele o papel de escritor e a esta o de musa inspiradora. Objeto de paixão de Cursino, Valéria é dotada de uma inquietação que a deixa de mal com a vida, sempre em busca de algo que perdure, o que afeta o escritor, bem como o relacionamento amoroso deles. De sinal distinto é a demanda angustiada de Cursino, o qual, pelo labor e percurso da escrita (13 histórias), vai traçando a sua perceção (ou a de Kismet?) sobre os caminhos de gentes, relações e vidas, interrogando-se sobre si e os outros, sobre o indizível do amor e dos seus momentos. Como se manifestam? Quem ama, ama o quê? Ama-se a si, ao outro, ao outro em si, a si no outro? E ama como? Sempre do mesmo modo, com a mesma intensidade? O desamor será ainda um estado de amor? Matar por paixão poderá ser outra estranha forma de amar?