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Procurar Soluções é Melhor Do Que Caçar “Piratas”

17/01/2012
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No debate sobre pirataria de eBooks, teci um comentário contrário no post do Fernando Tavares, diretor da Simplíssimo, e o próprio recomendou que eu o transformasse em um artigo. Bem, cá estou, expondo meu teto de vidro e acreditando que já seja hora de mudarmos um pouco o foco. Precisamos de soluções, e não pensem que elas virão do modo mais fácil, como sacudir o Mouse de Condão que fará desaparecer todos os sites de download.

Acredito que o “problema da pirataria” terminará não com a caça à pirataria em si, mas sim quando as editoras deixarem de se preocupar com ela e se preocuparem mais com os clientes. Impedir a pirataria é como remar contra a maré. Muitos dos que distribuem conteúdo tem uma ideologia e filosofia muito forte por trás de suas ações (não vou discuti-las aqui) e não serão convencidos de que fazem algo errado. Na Suécia, isso virou até religião! Usar leis mais rígidas contra essa onda resulta em projetos como o SOPA (sou absolutamente contra e espero que você também seja). E esses “piratas” estão muito dispostos a irem até o fim, planejando até mesmo lançar satélites para driblar a vigilância que os ameaça e desenvolverem uma outra “Internet”.

Não, não é uma briga interessante de se comprar. Pelo menos não para mim. Vamos olhar para o outro lado.

Se a “pirataria” existe e algumas pessoas a preferem, é porque há uma lacuna, uma brecha que outros preencheram em nosso lugar. Uma delas é a qualidade do serviço. Vamos encarar os fatos. Vimos depoimentos de pessoas comparando os livros digitais originais com os piratas. Isso significa que elas compraram os originais e se DECEPCIONARAM. Reclamações não faltam: DRMs que mais atrapalham do que ajudam (e que não impedem a cópia), design ruim, arquivos em PDF (até eBook em DOC foi mencionado), erros de digitação, problema de revisão (minha empresa mesmo já os cometeu – já mencionei meu teto de vidro?) falta de meta-informações… então, antes de caçar piratas, que tal arrumarmos a casa?

Devemos ter capacidade para responder a seguinte pergunta, com uma análise realista: se não houvesse pirataria, as pessoas comprariam o nosso produto? Qual é o prejuízo real? Será correto dizer que, se cem pessoas baixaram meu eBook que custa vinte reais, eu perdi dois mil reais? Essa afirmação é correta e precisa? Eu tenho absoluta certeza que não. Muitos baixam de graça por mera curiosidade, mas só compram quando têm certeza de que desejam ler.

Então, o que fazer? Ora, atrair o público para nossas editoras. Tenho acompanhado algumas delas que realmente possuem fãs. Sim, mais fãs e seguidores que os seus próprios autores. Minha empresa, pequenininha, ainda engatinhando, experimenta diversos modelos. Erro aqui, acerto ali, testo coisas acolá… e ganhei alguns fãs também, que não medem palavras para indicar nos blogs e redes sociais. Não é fantástico?

Um dos motivos mais mencionados para justificar a “pirataria” é o preço. Então, o eBook mais caro de minha loja custa menos de R$8. Claro que livrarias e distribuidoras encarecem, e meu apelo é que todo esse sistema seja reavaliado. Será que vale a pena simplesmente transportar o modelo de distribuição dos livros físicos – e suas porcentagens – para o eletrônico? Mas não cabe a mim avaliar a logística dessas empresas.

Alguns livros coloquei no sistema pay-what-you-want (que batizei de “pag-qnt-quer”), já comum no mercado fonográfico independente dos EUA. Já tive pagamentos muito acima do esperado. Indico esse artigo para conhecer o método e entender por que os fãs pagam MAIS quando não são obrigados a pagar:

Aqui é interessante ressaltar que os indies muitas vezes encontram as soluções que deveriam partir de nós, empresários e empreendedores. Infelizmente não pude convencer os distribuidores a disponibilizarem essa opção, já que eles vivem de porcentagens das vendas. (Não pude implementar o pag-qnt-quer nas minhas lojas feitas com Prestashop e Face Commerce, sendo obrigado a me limitar na plataforma WordPress, o que não é o ideal. Fica um apelo aos desenvolvedores de plantão para criar plugins e módulos para as plataformas de e-commerce que permitam o uso do modelo pay what you want aqui no Brasil. De preferência, que sejam open source).

Ainda falando de preços, também crio antologias para downloads grátis e já tive mais de 20 autores participando. Alguns deles já conhecidos dentro do chamado “fandom”. Outros, propuseram novas antologias, dispostos a ganhar nada (financeiramente) com elas. Com isso, os leitores acabam sendo direcionados a outras obras.

Outra opção para o mercado (que ainda não pude implementar, mas que vejo em vários lugares) é, ao invés de caçar piratas, beneficiar o cliente fiel através de cupons de promoção, brindes, etc. O “DRM Social” pode ser uma ajuda nesse quesito. Imagine se pudermos esconder nos códigos de um eBook o nome do cliente, permitindo assim que saibamos quem está distribuindo a cópia ilegal? Bem, eu não denunciaria, mas um diálogo poderia se iniciar. E ninguém, entre os que fizerem download daquela cópia seria beneficiado com as vantagens de ser um cliente fiel de minha loja virtual.

Disponibilizar “amostras grátis” do eBook também é requisitado pelos leitores. Por que não? Medo de que descubram que o livro não vale o preço de capa? Concursos culturais, promoções relâmpagos, mimos e outras estratégias de marketing também ajudam na fidelização de clientes.

Uma solução mais “estranha” é o uso de propagandas. Produções cinematográficas já fazem isso há tempos. Por que os personagens de eBooks não podem ir àquela lanchonete, cujo nome é um link para uma landing page, com geolocalização e promoções? Por que o herói não pode usar roupas da marca X, ou usar computadores da marca Y, comprados na loja Z? Pode-se cobrar por link ou por cliques. Dessa forma, livros podem ser gratuitos sem que ninguém fique no prejuízo.

Sei que são ideias que precisam de muito planejamento e que talvez não funcionem, na prática, ou só deem certo para alguns. Mas meu objetivo aqui é apenas mostrar que, com um pouco de esforço, podemos encontrar algumas saídas para sobreviver nessa realidade sem nos tornarmos obsoletos. Eu cheguei a muitas ideias desse tipo sozinho. Imagina o que conseguiríamos se nos uníssemos? O que acham? Vamos discutir novos modelos de negócios?

Deixo aqui o link do grupo do LinkedIn Novos Modelos de Negócios, iniciativa da minha amiga Tereza Kikuchi, que visa congregar profissionais do livro para discutir soluções para o mercado editorial.

E termino pedindo um pouco mais de sensatez aos “piratas”. Comparar as editoras brasileiras com as grandes corporações do entretenimento é tão injusto quanto chamar “pirataria” de assalto à mão armada. Muitas editoras duram menos de dois anos e não se sustentam. Que tal se juntarem a essa discussão e conhecer um pouco o nosso lado?

Artigo por Daniel Cavalcante, da editora Infinitum Libris.

 

  1. Ótimo texto, também acredito que não adianta combater a pirataria e sim tentar ter um bom serviço a bons preços assim fidelizando os clientes, como a amazon faz.

    Combater os piratas não vai dar em nada a indústria fonográfica está ai como exemplo e olha que eles são muito mais poderosos que pequenas editoras (e até grandes)

    O DRM como já dito no texto não serve para absolutamente nada apenas para atrapalhar um futuro comprador, ela não atrapalha o pirata visto que é MUITO FÁCIL remover a DRM, quem quer tirar tira e pronto.

    Essa idéia de o livro inserir as informações do comprador no seu código seria uma boa mas com certeza também seria burlado, mas acho interessante.

    A amostra grátis de 1 ou 2 capítulos, do livro devia ser obrigatório, se eu vou em uma livraria eu pego o livro em mãos e leio um pedaço para saber se eu quero comprar por que não podemos fazer isso também online, muitas editoras de fora já liberam um sample de seus livros um exemplo é a portuguesa saida de emergencia que é responsável pela série de grande sucesso Crônicas de Gelo e Fogo em Portugal, eles disponibilizam em média 100 paginas de cada livro para os leitores.

    A ideia do pague quanto quiser é ótima e bem difundida lá fora, aqui no Brasil nao sei como seria mas se você que já está usando disse que esse modelo funciona então vale a pena testar.

    Já essa idéia de propagandas eu sou totalmente contra, acho que até poderia ter antes ou depois do livro mas nunca no seu conteúdo, já basta o tanto de spam que recebemos diariamente em diversas mídias, na hora do meu lazer eu vou ler e ter que aguentar mais, me desculpe mas isso é sem condições…

    Bom é isso ai ótimo texto, com bons argumentos para gerar uma conversa e não uma briga.

    1. Obrigado, Gabriel. A ideia é oferecer soluções para todos, desde os mais preocupados aos mais “tranquilos” (como eu rsrs, mas vale lembrar que eu não represento 100% da minha empresa).
      Quanto a esconder dados do cliente no código fonte, dificilmente seria burlado se as pessoas souberem que isso existe.
      E quanto à propaganda, acredito que se feito de maneira discreta, sem que atrapalhe a leitura, não haveria problema algum. Por exemplo, “Samanta estava uma pilha de nervos. E, como de costume, buscou uma Skoll na geladeira para relaxar”. Acha que isso seria um incômodo? Opinem, pessoal, quero sabr o que acham.

  2. O mais engraçado é que a maioria esmagadora dos livros pirateados estavam em formato impresso, o que mostra que não tem sentido o alegado medo de ser pirateado com os e-books.

    1. O maior contribuidor da pirataria foi Gutemberg rsrs.

      Conheço gente que diz: “com o fim dos ebooks, diminuiria a pirataria. Tem que ser MUITO fã para piratear um impresso.”

      Não é o que eu testemunhei 15, 10, 7 anos atrás. E ainda hoje.

  3. Excelente artigo! Além das boas idéias apresentadas, acho que o grande mérito é mostrar que é possível (necessário?) ousar e que isso traz resultados. Também acho que muito do pirateado é por impulso, em um outro artigo um rapaz falou que tinha pirateado cerca de 60 livros, mas desses uns 50 ele nunca tinha nem aberto. É mais que óbvio que essa pessoa não compraria os 60 livros caso nao existisse a versão pirata. Mas e se fosse tão barato que ele comprasse por impulso da mesma forma que pirateia por impulso? (quantos joguinhos de $0,99 já não comprei na AppStore do iPad e nunca joguei??)

    Bem, parabéns de novo pelo artigo e pelas iniciativas. Abraço!

    1. Obrigado.

      Uma vez fiz uma pequena pesquisa, e a maioria afirmou: “eu compraria e-books baratinhos para saber se a obra é boa, e caso fosse, compraria o impresso.”

      Mais essa para nos tirar o sono rsrsrs.

  4. Adorei o texto, tem ótimas sugestões.
    Adorei a questão dos patrocínios dentro do livro. Afinal se os filmes estão cheios de imagens de marcas o tempo todo, o que impede que os livros também estejam? Acho que em muitos casos tornaria a história ainda mais real poder dizer que o personagem tomou uma Coca-Cola ou um Guaraná em vez de “um refrigerante”.
    Já surgiram discussões com amigos meus, quando ainda se questionava as vantagens do e-book e se ele realmente poderia substituir o livro físico (eu sempre achei que não e agora estou apaixonada pelo meu Kindle, apesar de continuar comprando e lendo livros físicos), e outras ideias apareceram, voltadas pra leitores um pouco mais sofisticados, como tablets, que seriam coisas como: inclusão de links pra fotos dos locais descritos (se reais) ou ilustrações; links pra uma possível trilha sonora ou música que o personagem esteja ouvindo no momento (Acabei de ler American Gods e o autor faz exatamente isso no final, indica onde conseguir algumas das músicas citadas); conteúdo extra como linhas do tempo e outros detalhes pra ajudar a organizar a leitura; possível acesso a um site especial do livro com todas as informações e bônus pra quem tiver comprado, etc.

    Mas ainda continuo com um pequeno incômodo com o fato de passar ou não cópias de e-books sem pagamento. Falo porque já fiz, sim. Antes de comprar meu Kindle eu comecei a ler uma série e um amigo que tinha comprado os e-books deu um jeito de me passar os arquivos pra ler no celular. Logo depois, assim que comprei o Kindle, comprei o livro que faltava da série. E não comprei os outros, que me foram emprestados, por um simples motivo: Gostei da série e pretendo comprar os livros físicos.
    E não consigo ver isso que fiz como pirataria, primeiro porque não houve lucro de nenhuma das partes, depois porque minha casa está cheia de livros físicos que posso emprestar quando bem entender sem ser considerado pirataria, e já li emprestados muitos livros que hoje já comprei pra ter a minha cópia. Por que isso deveria ser diferente no formato virtual? Afinal se emprestar cópias sem repassar direitos autorais fosse crime ninguém poderia emprestar livros físicos e não existiriam bibliotecas 😛

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