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Textbooks da Apple e a Cirurgia Estética Para Deixar o Livro Popozudo

31/01/2012
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artigo por Juliano Spyer.

A Apple é mesmo a cara do Steve Jobs. Pode ser ao mesmo tempo genial e não ter escrúpulos quando a meta é vender e ganhar um mercado.

Fiquei muito mal impressionado com a propaganda – abaixo – sobre o novo campo de atuação da empresa: livros escolares digitais.

O que há de novo e verdadeiramente relevante nesse produto? Uma coisa: reduz muito o peso que o estudante leva na mochila.

Agora, assisto a propaganda e me lembro de outro produto, pré-internet, que fez certo sucesso e desapareceu: o CD-room. (Lembram da enciclopédia Encarta?)

A retórica é a mesma: falar para pais que não entendem nada do assunto e que ficam deslumbrados com animações.

E fica a pergunta: onde está a interatividade do produto? Esses meninos vão poder aprender uns com os outros, entre pares, que é o novo da comunicação em redes digitais, que é o que está por trás da transformação trazida por Wikipédia, YouTube e Flickr, para citar alguns?

Resposta: Não existe. Esses produtos não se ligam entre si. Esse tipo de “livro” não serve para isso.

A traição deste comercial é vender algo genuinamente ultrapassado e obtuso com uma roupagem nova, siliconada.

As “novidades” que eles colocam dentro desses livros, os estudantes já encontram pesquisando na rede há muito tempo. Não é novidade.

E o que é entregue junto mas não está explicado é uma plataforma de venda de livros digitais. (Leia, se quiser, o post em inglês deste advogado especializado em licenças de uso falando sobre o software de produção de livros lançado pela Apple.)

Em uma das falas de professores defendendo o produto, há uma que argumenta que o livro físico perde a função. E o que a gente faz com o livro digital da Apple: devolve e recebe o dinheiro de volta?

Aliás, será que dá para emprestar esse livro? Ou revender para um sebo? Ou passar adiante para um amigo? Não sei e gostaria de saber.

O comercial é intelectualmente desonesto, inclusive por se fazer passar por documentário quando a gente sabe que as falas foram escolhidas para vender o produto. Não há poréns…

Acho que essa iniciativa é uma furada e, mais, ele tem cara daqueles produtos que governos compram de baciada só porque parece ser a “grande novidade do momento”. Como se isso fosse resolver o problema do aprendizado.

ps. 1: Quem está “pensando diferente”, “fora da caixa” nesse quesito da educação são os finlandeses – leia aqui – e até os americanos estão tentando repetir a fórmula.

ps. 2: Tem um professor no comercial que fala que usar livros impressos é condenar os estudantes a usarem tecnologia de ensino dos anos 1950. OK, ele está se referindo a livros didáticos, mas, antes dos didáticos, como as pessoas estudavam?

por Juliano Spyer, pesquisador formado em Antropologia na University College London. Artigo cedido de seu blog, o Não Zero.

 

  1. Vejo outros dois problemas graves:
    Se cada professor resolver editar seu próprio livro, — sem passar por revisor e editor — e colocar para baixar ou vender na Apple, o que garante que o livro não conterá erros. Ou que, por exemplo, afirme que a “superioridade da raça branca” ou diga que a evolução é uma mentira de comunistas?
    Outra coisa: de novo sem editor, quem será responsável pelo licenciamento de todos os penduricalhos midiáticos (videos, música etc) que a Apple estimula aos “authores” a incluir?

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