Ontem colocamos aqui no site alguns trechos de uma longa conversa que está acontecendo no grupo de discussão homônimo ao site. No dia 23 de fevereiro a participante Fernanda Garrafiel deu seu depoimento sobre o assunto de tablets e eReaders. Nesse post, reunimos um outro assunto que surgiu na conversa que já tem mais de 80 respostas. Qual é o futuro do livro, será apenas texto ou será totalmente multimídia?
Muitas outras mensagens interessantes foram enviadas, confira todas se cadastrando em nosso grupo!
Alê B: Pensar fora da caixa é pensar sem preconceito, não sem conceito. Livros estão aí por mais de cinco mil anos, funcionam, são práticos, não há problemas com eles, precisam de espaço e transporte físico, o que limita sua distribuição no mundo moderno, o e-reader ainda é livro, mais leve, de mais fácil difusão. Há de se mudar o que não funciona ou pode ser melhorado, mas multimídia não melhora livro. Se no meio de um parágrafo do Hemingway aparecer um “pop up” vai estragar a leitura. O autor trabalhou o que lá está, da forma que está, e é mestral, outros podem fazer o mesmo, ainda na linguagem do livro, palavras pretas no papel branco. O rádio não matou o livro, nem a televisão ou o computador.
Marcelo Izukawa: Acho que a maior barreira dos enhanced eBooks será o custo de produção. O desenvolvimento e adição de animações, vídeos e áudio ao texto aumentará seu custo . Talvez isso possa ser diluído sem problemas se for esperado um grande volume de vendas. Mas se for um livro com vendas medianas, pode vir a se tornar um prejuízo.
Marco Giroto: Exatamente, mas acho que é ai que as editoras irão evoluir. Elas irão se especializar em criar esse tipo de coisa e só irão fazer nos eBooks que acreditam que irão vender, ou seja, o que já acontece hoje, elas só publicam livros que acreditam ser viáveis comercialmente.
Dentro de alguns anos, se os ebooks se mantiverem apenas texto, as editoras serão descartáveis, os autores irão se autopublicar sozinhos. Enriquecer o eBook, ou o autor tem que ter dinheiro para fazer ou ter a sorte de uma editora acreditar em seu trabalho. As empresas que começarem a investir neste segmento, irão ganhar muito dinheiro lá na frente!
Fernando N.: Acho que há o espaço sim para livros enhanced com recursos multimídia em gadgets informatizados de última geração capaz de reproduzir texto, imagem, vídeo, som, 3d, cheiro e o escambal.
Mas discordo agora do Marco, em dizer que novas tecnologias mataram antigas seja uma falácia. Elas podem ter sido priorizadas, substituídas ou melhoradas, mas nem de todo matou alguma coisa. Sim, o cinema mudo morreu com o advento do som, mas vale lembrar que ainda se produzem peças de cinema com quase nenhum diálogo, e até mesmo há um filme mudo concorrendo ao Oscar esse ano. O rádio ainda existe, e eu acho ótimo que permaneça por muito tempo, ou você não o ouve no seu carro? Ele perdeu o status supremo com o advento da TV, assim como a Internet tem substituído o hábito da TV, e agora está saindo dos computadores de mesa, indo para notebooks, tablets e até smartphones. Há puristas da música que não trocam seu vinil analógico por digital nenhum, pois para eles é de qualidade inferior, e há um mercado de vinil que vem até crescendo. A prioridade muda, mas não mata algo da noite pro dia.
Há várias maneiras de se contar uma história, seja narrada de boca-a-boca por contadores de história, seja um livro apenas com suas letras, seja em um filme, uma animação, um vídeo-game, um quadrinho, ou até tudo isso junto e misturado – aka multimídia – (vide Matrix, que tem tudo isso para contar sua história). Um livro simplesmente é uma ótima maneira, antiga e simples, e satisfatória para muitos, além de mim. As vezes eu prefiro ler um livro a ver um filme, para que eu mesmo possa moldar o imaginário sobre os personagens e cenários, ao invés de ter o formato visual e pronto, e muitas vezes decepcionante, sem falar em coisas que a literatura produz que é incapaz de transmitir visualmente nem com toda a parafernália digital de hoje ou nunca.
Em resumo, dizer que o futuro dos livros é multimídia, é descartar a possibilidade do simples ato da leitura escrita e simplória. Coisa da qual não acredito que seja um substituto a ponto de não mais se fazer livros como sempre conhecemos, seja em papel, eInk, LCD, LED ou holograma. Acho que são duas coisas distintas, haverá espaço e adeptos dessa modalidade multimídia, provavelmente muito mais do que os leitores ‘tradicionais’ de hoje (ser humano é medíocre por natureza, e adora uma apostila, ou atire a primeira pedra quem nunca ouviu de alguém próximo – e até mais esperto que a maioria dos ursos – dizer que não vai ler tal livro porque vai esperar ele sair no cinema). Mas repito, são duas coisas distintas.
E se reparar, essa longa discussão toda, muitas vezes tocou na dificuldade das editoras em se adaptarem e produzirem livros digitais fidedignos e de qualidade, e estamos falando só do texto diagramado, quiçá falar em livros multimídia. Ou seja, se já está difícil formatar o livro textual simples dentro do formato digital, pensar que o futuro é exclusivo do multimídia é tentar matá-lo antes mesmo de nascer, e isso é dar um passo maior que a perna.
Separemos as coisas: Livro Digital (texto e poucas imagens estáticas) e livro enhanced multimídia, são duas coisas distintas, assim como o Cinema Mudo, Falado, a TV, a TV Digital, o DVD, o Rádio, o vinil, o CD, o Mp3, a Opera, o Teatro e a roda de histórias na fogueira.
Israel Cefrin: Eu li e ouvi algo parecido sobre o FLASH vs. HTML. Que o primeiro tomaria o lugar na web do segundo e tudo mais. Mas o flash hoje não serve para muita coisa além de jogos e algumas interações em desktop/notebook (nem dispositivo móvel mais a adobe dá suporte em seu SDK).
Alia-se a isso o fato de que livros enriquecidos com vídeos e outros elementos de interação, muito provavelmente terão seu tamanho aumentado de modo considerável. Obviamente que existirão formas de se embedar conteúdo externo, mas aí dependeremos de uma conexão com a internet constante, coisa que, por exemplo, num avião( momento sagrado de leitura 🙂 ) ainda é raro. Um vídeo em HD de 1min pode pesar 30~100Mb. Imagine que dez vídeos de 2 minutos podem pesar até 2Gb(!!) no eBook final.
Mas tem outra coisa ainda é aquele público que não quer a animação cheia de efeitos, mas apenas consumir o conteúdo textual. Sim, existe público que não se interessa pela sua animação ou vídeo pois não podem consumí-lo ou simplesmente preferem usar sua própria imaginação para construir as representações visuais. Acredito que um livro multimídia (vídeos, sons e animações) possa ser mais usado no campo lúdico ou didático que também tem alto grau de representatividade do que aplicado a toda forma de publicação. Um livro sem esse enriquecimento não precisa de editora? Bem, cabe a esta descobrir seu papel então.
Marco Giroto: Você está raciocinando com a internet que você conhece hoje, e não a internet de amanhã, daqui 3 a 5 anos. A internet será MUITO mais rápida e um vídeo de 100MB será equivalente a um vídeo de 1MB. Outro erro é achar que tudo será “baixado”. Todo o conteúdo estará na nuvem e será requisitado sob demanda (streaming).
Em um futuro próximo, todos os lugares estarão conectados, wiFi, 4G, 5G. Já temos companhias áreas permitindo usar dados nos aviões. Se for para o meio do mato, onde não existirá internet, você seleciona os eBooks que deseja ler, faz o seu aplicativo criar um “cache” dos eBooks e poderá acessar offline (O Google eBooks já tem essa opção).
Flash vs. HTML5 é outra história, são tecnologias que podem se complementar ou não, assim como, poderá surgir outra coisa muito melhor. Mas creio que o HTML5 será o padrão por um bom tempo.
Luis Dantas: Mesmo nos limitando ao conceito de “livro” como sendo um objeto com algum tipo de papel agrupado e com texto, talvez ilustrações, já temos uma variedade impressionante hoje em dia. Há livros em que o que importa é o texto em si, há manuais de fotografia em que as ilustrações são absolutamente centrais. Até mesmo na Bíblia encontra-se livros que são quase eróticos e livros que são praticamente manuais de etiqueta.
Enquanto experiência, os livros sempre foram sobre o desafio de ter um material restrito e criar experiências diversificadas a partir destes.
Por isso, eu acredito que a tecnologia de ebooks (no sentido amplo) não vai levar a uma uniformização e sim a uma diversificação radical do produto. Assim como existem livros de banho para crianças feitos de plástico e livros de dobraduras em que cada página abre uma construção diferente em três dimensões, com certeza não vai deixar de haver experiências com as possibilidades que tablets e outros produtos eletrônicos abrem:
– livros realmente interativos, que escolhem até mesmo a linguagem usada a partir do perfil mostrado pelo usuário nas interações anteriores.
– livros em tempo real (sobre astronomia, por exemplo) que consultam informação relevante na Internet quando necessário. E aí já começa a haver uma fusão com os periódicos eletrônicos.
– livros em que o enfoque é de fato no texto (não é todo livro que se beneficia realmente de ter ilustrações, e não vai ser todo livro que a se beneficiar de recursos eletrônicos em grau significativo) mas que ainda assim terão as vantagens de poderem ser lidos mais casualmente, em uma variedade maior de ambientes e situações, e com mais opções de interface. Um dos maiores benefícios dos ebooks é o grau de acesso à informação que trazem para deficientes visuais. Penso que inclusive estamos no limiar de descobrir maneiras de melhorar a interação de pessoas com quadros da família do autismo, criando livros mais sensorialmente atraentes.
– livros em que a proposta é, como indicado pela Fernanda, ter uma equipe de pessoas qualificadas contribuindo em suas respectivas áreas para ter o melhor produto final possível… e outros em que, pelo contrário, uma só pessoa assume vários ou até todos os papéis para ter o produto mais pessoal possível. Faço um paralelo com certos quadrinistas, que em momentos vários decidem que preferem cuidar do argumento e da arte, ou do lápis e da arte-final, em vez de dividir as responsabilidades. Não é para ser sempre assim, mas haverá casos em que acontece e apresenta um excelente resultado.
E por aí vai. A publicação de livros tradicionais vai continuar acontecendo, tenho certeza. Mas a fronteira entre o que é livro, o que é livro eletrônico, o que é multimídia e o que é aplicativo web vai se tornar extremamente confusa e os produtos finais serão cada vez mais variados e adaptáveis ao gosto não só do consumidor, mas também do autor. Michael Moorcock, por exemplo, é conhecido por sua tendência a reescrever significativamente livros que já publicou anos ou décadas atrás. Quem sabe no futuro não teremos mais autores “wiki”, que se reservam os direitos autorais mas também o direito de revisar o texto quando e como quiserem? Pode vir a surgir inclusive um mercado específico para _atualizações de livros_ em contraste aos livros propriamente ditos.
Eu dou aulas de Língua Brasileira de Sinais. Se os e-books pudessem ter vídeos feria ótimo, pois eu poderia criar um onde o estudante tivesse a visualização do movimento e não uma imagem fixa. Seria uma ajuda e tanto na hora de estudar fora da sala de aula.
Oi Soraia, bom dia. Nós já temos um ebook publicado que faz quase exatamente o que você propõe — mostrar um vídeo com o movimento. Porém, como são muitos movimentos, o ebook simplesmente fica inviável por causa do tamanho dos vídeos juntos. A solução que o autor encontrou para isso, foi colocar um link para os vídeos dentro do ebook, redirecionando o leitor para ver os vídeos no Youtube. Você pode conhecer o trabalho dele neste link: https://amzn.to/33CoaWt