Já disse isso outras vezes por aqui, mas é bom frisar: embora seja muitíssimo entusiasta dos eBooks e consumidora de livros digitais no sentido mais capitalista do termo (ou seja, eu compro eBooks), continuo adquirindo impressos quase no mesmo ritmo de antes.
Há duas razões para eu comprar um impresso ao invés de um eBook: 1) a indisponibilidade do título em versão digital; e 2) o esmero da edição de uma obra que tenha expressivo valor (na minha ótica, claro). Mesmo para títulos que já possuo a versão impressa, se encontro uma versão digital com preço razoável, compro. Desperdício de grana? Acho que não, pois o grande ganho de ter um eReader que pesa menos de 300g sempre na bolsa é poder aproveitar o insumo mais escasso que existe para saciar minhas ganas de leitura: o tempo. Minha desorganização e uns probleminhas de coluna não permitem carregar comigo todos os livros que gostaria, mas o eReader sim, e isso faz qualquer fila ou sala de espera uma oportunidade de mergulhar na leitura – e com direito a muitas opções.
Um exemplo concreto: Tenho o eBook Narraciones Extraordinarias de Poe e um pocket da L&PM de nome similar que contém a maioria dos contos da Kindle Edition e outros mais. Eis que, sábado passado, encontro um amigo na Cultura com uma encomenda nas mãos – era uma edição ilustrada por Harry Clarke, da Tordesilhas, que me deixou babando. Boa parte dos contos, senão a totalidade, estava em uma ou outra das edições que já possuo (ou tenho licença de uso, no caso do eBook), mas só não voltei para casa com um volume idêntico ao do meu amigo porque não havia outro exemplar na loja, seria preciso encomendar.
Trago esta situação porque me parece que ela ilustra ou lança outra luz a algo que já discutimos muito na lista Revolução eBook – as imensas possibilidades dos eBooks como “meras” repetições dos livros impressos – mas uma repetição do melhor e não do banal. Não pretendo aqui defender que não se busque inovação e “funcionalidades” que podem ser revolucionárias para o ensino ou o entretenimento, isso já afirmei algumas vezes. Insisto,porém, que aqueles que amam o texto – não qualquer texto, mas os melhores, os que impressionam, desassossegam e nos derrubam da mesmice dos dias – possam ter à sua disposição, em formato digital, o que há de melhor e com uma boa produção.
Debates surgem e se renovam, divagando sobre o “futuro” do livro e a necessidade do eBook reinventar o obsoleto objeto recheado de páginas monotonamente preenchidas por caracteres. Eu faço parte de um grupo, talvez reduzido, de seres um pouco retrógrados que vê muita graça nesse tipo de “produto”. Pode ser que não representemos uma promissora fatia de mercado para os próximos anos, mas ainda existimos e, se não há no mercado nacional um fornecedor qualificado para nossas demandas, compramos de fora. E vejam só, embora haja limitação na oferta de títulos (não estou considerando sequer o público que se aventura em outros idiomas), já temos um volume razoável de obras em português na Amazon. Esses números crescerão, mesmo que não se concretizem muitos acordos com as editoras nacionais, pois os autores independentes (dentre os quais sempre haverá algum de muito boa qualidade) começam a investir, também de modo autônomo, na tradução de suas obras.
Com todo esse cenário, sigo me perguntando: por quê as editoras e demais envolvidos com o mercado e que tenham real interesse em fazer esse negócio frutificar no país, não dedicam-se a produzir ótimas edições digitais capazes de fazer essa gentinha chata como eu ter derrubadas as duas principais motivações para não escolher um eBook no lugar do impresso???
Um lembrete final: tudo o que discuto sobre eBooks (como leitora) tem a ver com obras de literatura e, muito provavelmente, não tem aplicabilidade sobre o cenário de livros técnicos, não-ficção ou determinados nichos muito específicos.