Confiram esse artigo de Bruno Felin publicado no Jornal do Comércio. Um retrato bem, beeeem básico do mercado de livros digitais no Brasil.
A busca por uma resposta sobre como os eBooks (livros digitais) se estabelecerão no mercado editorial é tarefa árdua. Os setores envolvidos possuem opiniões conflitantes e os novos atores – principalmente empresas de tecnologia – entram neste jogo com interesses diferentes de editores, escritores e livreiros.
Enquanto empresas como a Amazon, com o Kindle, a Apple – com o iPad – , a Samsung e seu Galaxy Tab, e tantas outras emergentes, como a brasileira Positivo, que acaba de lançar o Alfa, lutam para estabelecer uma plataforma dominante, editoras e autores tentam se proteger e criar uma relação justa de mercado, que possa fazer dos livros digitais uma nova plataforma, mas que não derrube o seu meio de sobrevivência central: a venda de edições físicas.
A verdade é que, apesar de o comércio de tablets crescer progressivamente no Brasil, com mais de 400 mil unidades vendidas somente neste ano segundo a empresa de pesquisa IDC, ainda não é possível medir quantos deles estão sendo usados para a leitura de livros. Mesmo com um crescimento progressivo constatado nas vendas de eBooks – é um mercado que começou há poucos anos – a porcentagem representativa deste tipo de livro ainda é de apenas 1% da receita das editoras.
Para trabalhar estas questões, seis grandes editoras nacionais (Objetiva, Record, Sextante, Planeta, Rocco e L&PM), que representam cerca de 50% do mercado editorial brasileiro, se uniram para formar a Distribuidora de livros digitais (DLD), uma intermediária oficial entre as empresas, seus títulos e as redes de livrarias. A intenção é proteger-se acima de tudo, seja para controlar a venda, evitar o compartilhamento de arquivos ou tentar unificar uma maneira de se comportar neste nicho.
Entretanto, para o responsável pela editora gaúcha L&PM, Ivan Pinheiro Machado, “o mercado não existe”. Conforme o editor, “estamos entre as editoras que mais têm livros digitalizados à venda na nossa área (ficção e não ficção) e eles correspondem a 0,3% do faturamento. Um livro que era 1º lugar na lista da revista Veja, Feliz por nada, da Martha Medeiros, num mês que vendeu 26 mil edições físicas, foram apenas 86 eBooks. Garanto que as vendas em eBook da biografia de Steve Jobs não pagam um jantar do Luiz Schwarcz (fundador da Companhia das Letras) e seus amigos”, aposta, sem perder o humor.
Por outro lado, quem explora esse nicho no mercado das editoras cresce dia a dia. É o caso da Xeriph, empresa dedicada a converter, publicar e distribuir os livros digitais de forma segura. Ela foi criada por uma necessidade de Carlos Eduardo Ernanny, mais conhecido como o criador do site Gato Sabido, a primeira loja virtual de eBooks do Brasil (que conta com editoras como Companhia das Letras, Saraiva e Intrínseca). “Vendemos em média dois mil livros por mês via Gato Sabido e publicamos dez livros novos por dia via Xeriph”, conta Camila Cabete, responsável pelo editorial do site e pelo comercial da Xeriph. “Um por cento (participação dos eBooks nas vendas de livros) é muita coisa se você considerar que a nossa população ainda tem poucos tablets e smartphones”, pondera.
A briga por formatos é outro grande entrave para o mercado se popularizar. Cerca de 70% dos livros disponíveis na Gato Sabido são em PDF, mas o formato que pode ser lido na maioria dos tablets é o ePub, com um custo entre R$ 200,00 e R$ 300,00 para a conversão, e possui a capacidade de adaptar-se às diferentes telas. Para proteger-se do compartilhamento ilegal de arquivos, a maioria das editoras tem utilizado o DRM (Digital Rights Management), produzido pela Adobe. Com ele, é preciso criar uma conta e, além de baixar o arquivo para o computador, transferir para o aparelho. “É uma maneira que encontramos nesse momento para proteger o livro, mas com certeza esse sistema deve evoluir no futuro. O DRM não é uma coisa muito esperta, por que torna o processo de compra muito complicado e, enquanto isto for difícil, o produto não vai se espalhar”, conta Marina Ferreira, responsável pelo setor de e-books da L&PM.
Em sala de aula
Pensar os eBooks apenas como literatura, digamos, “trivial”, é esquecer as possibilidades que os aparelhos disponibilizam. Com formatos novos, em plena evolução, como o ePub3, baseado em HTML5 – que proporciona melhor suporte para vídeo, áudio, scripting e interatividade digital – novas portas se abrem para a experiência de ler.
O Grupo A, detentor de diversos selos editoriais de livros acadêmicos, técnicos e científicos, busca nessa possibilidade uma maneira de entregar um produto mais completo. “Hoje há uma vantagem clara: os livros clássicos de medicina são grandes e não são funcionais. No momento que ele passa para um dispositivo leve, digital, já é uma vantagem”, explica Bruno Weiblen, gerente de novos negócios da empresa.
“Mas obviamente, quando ele for pensado em outras possibilidades que essa tecnologia proporciona, vai trazer um novo nível e uma diferença que pode ser brutal entre a experiência de um Enhanced e-book (livro digital “enriquecido” com multimídia) para um livro tradicional. Isso integrado a plataformas de aprendizagem para uso em salas de aula é o que vai fazer diferença ao processo de ensino”, avalia Weiblen. A plataforma a que ele se refere é um sistema no qual alunos e professores podem compartilhar comentários e notas.
As oportunidades são muitas. Os eBooks enriquecidos também suportarão o uso de vídeos explicativos, gráficos com capacidade de o aluno realizar simulações, além de exercícios em que o professor pode acompanhar como anda o rendimento do aluno em cada assunto da aula. Em quantos anos eles farão parte das escolas, ou se a venda de e-books será rentável para editoras, só o tempo dirá.