(…) Como consequência indesejável da demora, a própria discussão pode se tornar irrelevante para o presente.
Parece ser o caso da discussão sobre o “livro eletrônico”. O CD-ROM está com os dias contados. Qual a utilidade dessa discussão para a sociedade neste momento? É possível, contudo, atualizar o debate. É possível que os ministros tornem a discussão relevante, apesar de o tema original do recurso estar praticamente obsoleto.
Na sua versão original, o debate no Supremo envolvia discutir se o conceito de livro é capaz de abranger um conteúdo que não contenha certas propriedades físicas que entendemos tradicionalmente estar entre os seus traços distintivos (por exemplo: ter capa, folhas tangíveis e a aptidão para adornar uma estante). Essa é uma pergunta jurídica bastante tradicional. O que um dispositivo quer dizer quando fala em “livro”? Ou, mais especificamente, uma mídia de leitura que não tem capa ou folhas nem vai para a estante ainda conta como “livro”?
A clareza da pergunta é reconfortante. Ela pode estruturar o debate entre os ministros de uma maneira organizada, com todos respondendo, de maneiras similares ou não, a uma única e focada questão. Mas esse conforto precisa ser resistido.
Por trás da controvérsia apresentada ao Supremo, há um problema cada vez mais atual. Cada vez mais, o intangível substitui o tangível em várias áreas da vida. Mas mesmo o intangível tem, nesse caso, um suporte material: o conteúdo eletrônico precisa de um algum tipo de leitor digital. Mais importante do que saber o que é “realmente” um livro, seria debater se, para fins tributários, o leitor de livros eletrônicos é o equivalente no século XXI ao “papel destinado à impressão” dos livros no mundo pré-digital.
As discussões jurídicas são estruturalmente diferentes. No caso levado ao tribunal, o problema é de determinação de sentido de um termo (“livro”) que, no caso específico, revela-se vago. Deve o dispositivo ser interpretado extensiva ou restritivamente? Na segunda hipótese, a questão relevante é saber se o texto que prevê a imunidade não acaba excluindo um caso (o do leitor de livros digitais) que, à luz dos seus propósitos, deveria estar no âmbito de incidência da regra constitucional. (veja o texto completo aqui)